Se vivesse mais 100 anos e se todos os anos falasse uma vez com os pais sobre o assunto, outras 100 vezes B. ouviria dizer que aquela garrafa era de 1973. Era, na verdade, de 1974, não exactamente do ano em que nasceu, mas o mais perto que se arranjava. Pouco lhe importava. Importava, isso sim, a história de vida que aquela garrafa de vinho Madeira lhe contava. Ao recebê-la - depois de umas férias dos pais na Pérola do Atlântico - B. decidira guardá-la para ocasião especial. Traçou-lhe como meta ser aberta no dia em que quisesse brindar à notícia que, sabia, um dia haveria de dar-lhe um sorriso, bem como fazer os seus pais darem o passo seguinte na carreira familiar: tornarem-se avós. O vinho era especial e como especial foi guardado no ponto mais alto e escuro da despensa. Inalcançável, como se a distância ao braço representasse a distância da vida de B. ao dia para o qual reservara a garrafa, a pobre foi envelhecendo. Abandonada, esquecida. Certo dia, B. cansou-se. Cansou-se de outra...