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24. O dia depois. O dia antes

Aquele 24 de Dezembro não foi um dia normal. E., que passara o dia anterior fechado em casa a chorar e a rezar, a rezar, a rezar e a rezar (rezou muito mais do que o que aqui se diz, mas a repetição excessiva é sempre de evitar), queria que Deus o levasse. A ele, sim, que já não aguentava passar mais dias 23 de Dezembro sozinho. Era o dia em que E., a sua mulher (sim, também E.) faria anos. E rezou. E chorou. Aquele 24 foi o dia depois de ele rezar e rezar e rezar e rezar (e muito mais rezou ele). No dia 25 Deus, o Deus a quem ele rezou e rezou e rezou e rezou a pedir que o levasse para junto da sua E., levou-o. Hoje é outra vez 24. De Dezembro. Passaram 11 anos daquele dia depois que também é dia antes. E uma faca corre, afiada, a chegar à ponta do nariz, a querer lembrar que numa só lágrima pode estar um mundo. E muito mais que isso...

Porque há textos que não podem ser apagados

A aventura do coiso Falando sobre o carnaval brasileiro, Luís Pereira de Sousa referia-se à "genitália desnudada" dos participantes. A expressão, singela como o autor dela, parece parte dalgum hediondo soneto do século XVIII - "Oh desnudada genitália de doce nereide / Só de pensar que um dia te hei-de". Et caetera. O pobre Pereira de Sousa não tem culpa. O problema é comum a todos os portugueses - como é que alguém se refere à genitália no dia a dia? Uma pessoa vai ao médico e queixa-se: "Sr. doutor, ultimamente tenho tido uma certa comichão na genitália?" e ele manda pôr a genitália de molho? Tem de se falar nestas coisas. Assim como não há nome para chamar um empregado de mesa, tem de haver um nome não-ordinário para as nossas partes. E falando em partes gagas, os freudianos, como o Eduardo Prado Coelho, dizem "falo", mas é muito pretensioso. Dá para imensos trocadilhos entre o falo e o falar, em longos textos sobre o desejo e o indizível, mas...