Rios que vão dar ao mar
A água que, quente, brotava do chuveiro pendurado e lhe lavava o corpo não a purificava mais do que as lágrimas que, a ferver, lhe brotavam dos olhos e lhe lavavam a alma. Redescobrira, naquele momento, a força de uma oração. Logo ela, que há tanto tempo não rezava. Vá, a menos que contabilizemos todas aquelas vezes em que se sentou em lugares de avião, sempre à coxia – para não ter de pedir licença a ninguém quando lhe apetecesse levantar-se. Enquanto deixava a água, a tal que fervia, aquecer-lhe o corpo, Maria dizia para dentro, como quem grita sem se fazer ouvir. “Meu Deus, porquê agora? Porquê a mim? Vais dizer-me que esta é mais uma expiação para os meus pecados? Vais dizer-me que ainda não os expiei a todos? Que queres ver-me sofrer outra vez? Ajuda-me, por favor, a ser forte. Ajuda-me a encontrar o meu caminho. Por favor, nunca te peço nada, mas não me tires este sorriso. Sabes? Fazes-me sentir o que nunca senti. O que sempre achei impossível. O que sempre olhei com desdém”. Nes...