Maria e Alberto (não é mais uma parvoíce para supostamente ter graça - nem sempre queremos ter graça)

A - Estouuuu?
M - Sim? Quem fala?
A - O Alberto... estás bem, Maria?
M - Alberto? Passados todos estes anos? Depois de me teres esquecido, voltas a ligar assim, sem mais nem menos? É preciso ser mesmo cara de pau...
A - Tu sabes que não te esqueci. Não vale a pena fazeres um filme a partir do nada...
M - Então porque deixaste de atender os meus telefonemas?
A - Queres mesmo saber?
M - Quero, claro.
A - Porque nos primeiros tempos te ligava e sentia-te tanta raiva que isso, pensava eu, me matava. Sentia-me desprezado.
M - Mas eu nunca te desprezei, nem odiei
A - Pois, mas imitavas bem. Ou nem te ap...?
M - (interrompendo) Lá estás tu com as tuas acusações. Foi para isso que me telefonaste?
A - (irritado) Deixa-me falar... Passados tantos anos continuas igual! Não consegues ouvir-me sem interromper-me? (de novo com voz doce) Não, não te liguei para te acusar. Foi para te dizer que estou vivo. Que a todos os 25 de Novembro me lembro de ti. E que em todos estes anos estive com o telefone na mão, nesse dia, para te ligar.
M - Pois, pois, lá vens tu com falinhas mansas... Que queres, afinal?
A - (...)
M - Vá desembucha... és sempre o mesmo! Sempre a fazer-me perder tempo. Despacha-te que tenho cabeleireiro marcado e tenho de ir comprar gelado para o jantar. A Maria vem cá e eu estou atrasada... Que raio, que coisa, sempre a engonhar. Deves ter algo de muito importante para me dizer, espero...
A - Tenho cancro. Vou morrer...
M - (...)
A - (...)
M - (...)
A - Estás aí?
M - (...) nmmmmmmmm
A - Estou internado, há três meses deram-me dois de vida. Dói-me o corpo todo e os médicos disseram-me que iam dar-me alta esta tarde...
M - nmmmmm, mas isssmnnnn quer dizer qmmnnn estás melhor? (soluçando) Desculpa-me, desculpa, a sério, desculpa-me...
A - Vou estar, em breve. Vou estar, quando desligar esta chamada. Vou estar porque sei que antes de me ir embora te ouvi e te disse que sempre te amei...
M - mmmmmmmnnnnnnn
A - Mesmo quando te foste embora, dois dias depois do nosso filho ter acabado o curso de engenharia. Sabes, não houve um único dia que não te chorasse, que não encontrasse na tua velha almofada o teu cheiro...
M - (recuperando fôlego) Porque me dizes isso agora?
A - Porque posso sobreviver mais duas horas ou dois dias. E queria ver-te só mais uma vez. E fechar os olhos contigo ao meu lado.
M - Porque não me disseste isso quando saí porta fora, há 22 anos? Só uma palavra teria bastado
A - mmmmmnnnn

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