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Covid-19 (dia 7 - 19/3) Dia do Pai

Mais um dia a madrugar... Como ontem já tinha dito, hoje teria de atacar um supermercado pela manhã. Afinal, o leite de aveia é fundamental cá por casa (pois não se bebe o de vaca) e estava mesmo a acabar (um pacote). A decisão nunca é facil. Ir ou não ir? A este ou a outro? A que horas? Segui o conselho de uma amiga e repeti a experiência dela na véspera: Às 7h30 lá estava eu à porta de um super dos mais pequenos - e que abrem mais cedo. Sair à rua é como ir para Chernobyl. Uma roleta russa: comprar comida a que preço? Arriscando infeção? No caminho, carros e mais carros. Na rua, no centro de Lisboa, gente e mais gente. Em estação de comboio central mais movimento do que me parece aceitável. Fico com a ideia de que há patrões a insistir na manutenção da atividade, talvez achando que isto do Covid-19 é uma histeria coletiva. Dentro da loja, funcionários sem máscaras, sem luvas, numa aparente normalidade. Pergunto-me se não lhes passa pela cabeça o risco? Ou se passa, mas es

Covid-19 (dia 6 - 18/3) - um começo doloroso

Despertador para as 7.30. O dia começa como se estivéssemos em guerra. Faltam legumes para a sopa e fruta e a hora melhor para ir às compras é o arranque do dia. Máscara, luvas. Quatro pessoas de cada vez na frutaria. Espero pouco. Faço as compras para três casas e saio. Chego a casa e divido tudo por três sacos. Acabo, aspiro o chão e ainda penso na conferência de imprensa que vinha a ouvir no carro: os estímulos de 3 mil milhões de euros à economia.  Sinto-me atropelado por um camião. Emocionalmente, nem tanto fisicamente.  Dias assim transportam-me para o cenário de um filme de ficção científica. Para piorar, estou desde ontem com um siso a querer doer. Não sei o que fazer. Espero que passe... E isto aumenta o pânico.  Vamos todos ficar bem, penso no arco íris que a minha filha desenhou. Que fiquemos, sim! Penso só em proteger a família e a pensar nos miúdos tiro a máscara ao entrar em casa, de modo a não assustar. De seguida penso que se calhar dever

Covid-19 (dia 5 - 17/03) - Um dia bom

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Portugal passou os 400 casos de Covid-19, quem quer fazer compras de supermercado online tem de ficar numa fila de espera virtual (para depois não haver metade do que quer comprar), amanhã (diz-nos ao fim da noite de hoje o Jornal de Negócios) Marcelo Rebelo de Sousa vai decretar o estado de emergência e obrigar-nos a todos a ficar em casa e isso, sabemos lá nós como, é capaz de dar um bocadinho cabo das nossas vida profissionais e até financeiras. E, no entanto, ao fim do quinto dia de isolamento social (auto imposto), dei por mim a vir até à sala e, enquanto tomava um chá, olhar para a minha mulher e dizer: hoje foi um dia bom, não foi? Sim, houve gritos da criançada - como há sempre - algumas zangas, a palavra mamã e a palavra papá gastas de tanto serem usadas, correria para a frente e para trás, alguma pressão dos infantis que pela primeira vez se queixaram de (e usaram a palavra) tédio. Houve também notícias de o mundo se ir fechando cada vez mais; de o Euro-2020 de futebol pa

Covid-19 (dia 4 - 16/03) - Pokemon Go

Morreu o primeiro português vítima de Covid-19. E os portugueses perceberam que a estatística é assustadora: que lá para o fim de março possivelmente haverá 50 mil infetados (que isto dobra a cada dois dias - e hoje há 331 casos). Não passou muito tempo e de repente tudo o que escrevi acima deixou de provocar-me arrepios. Calma, não sou um monstro nem fico insensível a nada disto. Tão pouco estou menos preocupado que ontem. Hoje pela primeira vez não senti à vez todos os sintomas.Nem isso nem ataques de ansiedade. Vá lá que já só faltam prái 150 dias para nos livrarmos disto! Este dia trouxe mais novidades. Antes de mais, fizemos uma aula de ginástica em casa. A família toda, via Youtube. Depois começaram as novidades: da escola chegaram trabalhos para os miudos. Ela pintou um arco-iris e a frase "Vamos ficar todos bem"; ele fez contas, viu vídeos de estudo do meio na plataforma Escola Virtual e adorou. Queria responder a mais testes, ver mais vídeos... Provavelmente an

Covid-19 (dia 3 - 15/03) - Arroz de feijão e ruído crescente

Confesso, eu que sou asmático e tenho um pai que faz Bingo na lista das comorbilidades associadas ao Covid-19, todos os dias acordo numa espécie de sobressalto. A primeira coisa que o meu cérebro faz é uma verificação ao hardware: dói a garganta? consegues respirar? tens dores musculares? fraqueza generalizada? tosse? Naqueles três segundos, estou em suspenso. Acho que estamos todos em suspenso. Não três segundos, mas há uns dias. E por mais uns quantos. Todos temos opiniões fortes sobre se deve ser decretado estado de emergência, todos sabemos muito bem as implicações de se fechar as fronteiras terrestes com Espanha e todos temos opinião sobre o discurso de Marcelo Rebelo de Sousa por webcam manhosa ao país. Hoje o dia foi difícil. Foi só o terceiro em casa, mas os miúdos estiveram mais agitados (ou então nós com menos paciência). E o tom de voz vai subindo mais vezes do que gostaríamos. À noite, o mais velho teve insónia e só há pouco (já depois de acabar de ler o Diário de

Covid-19 (Dia 2- 14/03) - Os pais

Acordei às 8.30 horas, quando queria dormir mais 8 horas, com o barulho dos petizes (se fosse dia de escola não estariam por certo acordados tão cedo). Antes de mais, vamos lá esclarecer uma coisa, para desmistificar: não meus queridos, não estão a ficar doidos! O que estão a sentir todos sentimos: todos os sintomas, a toda a hora. Ao acordar é o nariz e as vias respiratórias a arder, a dor de garganta insignificante, duas tossidelas por dia, o nariz sempre húmido e até a dor no peito que mais faz parecer que lá vem um ataque cardíaco. Não sou médico, nem quero desencorajar-vos de ligar para linha Saúde24, mas espero que no fim tudo isto seja apenas o que me parece (e desejo) ser: ansiedade. É a ansiedade de pensar que podemos apanhar o vírus e levá-lo a outros; que alguém que nos é querido pode ser apanhado; que mesmo que ninguém próximo seja infetado, isso em nada reduz o drama de uns quantos milhares; a ansiedade de não sabermos quando é que isto acaba, seja porque se inventa

Covid 19 (dia 1- 13/03) - O início

O meu dia 1 do Covid 19 não foi ontem (13/03/2020), mas façamos que sim. Porque ontem foi o primeiro dia em que o meu patrão me mandou trabalhar em casa. Entrámos num esquema de dividir o pessoal em duas metades que nunca se cruzam, de quinta a sexta. Uma semana estamos na redação, a outra em casa. Adiante, que isto é mera introdução. Decidi escrever um diário da minha convivência com o Covid-19 porque hoje foi, além do primeiro dia que fiquei em casa a trabalhar, o primeiro dia que os meus dois filhos não foram à escola. Ele está com 9 anos, ela com 4. Têm ainda pouca noção do que se passa e menos (ainda) capacidade para o perceber. Bem que tentamos explicar-lhes, ir alertando sem alarmar, mas tudo é ainda uma festa. Foi quando a meio da manhã lhes deu a fome do "lanche da manhã" que me assustei (e pensei em escrever). Nunca fui de açambarcar supermercados em alturas de crise (nem de encher o carro com bidons de combustível em situações de aperto), mas quando hoje eles