Agora um texto mais sério sobre João Bonifácio
Porque o caso: "Povo contra João Bonifácio" não cessa de trazer novidades, copio para aqui uma carta publicada no blogue do Provedor do Público e que pode muito bem ser utilizada para expor o que penso sobre o assunto.
Como leitor do PÚBLICO, impressiona-me que seja possível que uma reportagem possa ser totalmente preenchida com opinião do autor. Ao escrever sobre o festival, João Bonifácio não informou sobre o número de pessoas presentes, sobre os problemas que os "festivaleiros" tiveram, como por exemplo falta de casas de banho e filas de hora e meia para comer.
Pretendeu, apenas, usar as páginas do jornal onde escreve para dar uma opinião pessoal sobre o que viu e sobre o que não viu.
Que João Bonifácio não goste das bandas que tocaram no estádio do Restelo, que não goste do clube que joga no estádio do Restelo, nada contra. Que o transmita no texto que publica no jornal PÚBLICO já me surpreende mais. Não tanto por ser o senhor Bonifácio, sim por ser o PÚBLICO.
Refere-se aos adeptos do Belenenses como meia dúzia de "velhinhos" e ao ambiente do estádio como calmaria tal que "nem uma palha bule, é um sossego".
Conclui a ideia com esta barbaridade: "Portanto a ideia de fazer um festival de música popular naquele mesmo estádio quase parece uma acção de beneficência."
Deixando os velhinhos atrasadinhos mentais do Belenenses para trás, vamos então ofender os leitores. Afinal, pelo que leio no PÚBLICO, o comportamento de quem gosta de música rock num concerto é primário e culpa dos tempos de mudança, pelo menos na cabeça do sr. Bonifácio.
"Estavam entre mil a duas mil pessoas a vê-los, que gritavam quando as guitarras se levantavam. Mas bastava olhar para aquela juventude para notar ao que vinham: tinham t-shirts dos Killers, o nome The Killers desenhado nos braços, cartazes com a inscrição The Killers. Gritavam quando as guitarras explodiam porque foi isso que a música dos The Killers lhes ensinou: quando o volume explode, há que berrar".
Ou seja, os Killers ensinaram os burrinhos que ouvem rock há anos, que devem saltar e berrar (fazer, portanto, o festival que o senhor Bonifácio entende que não existiu - contraditório). Lamentável!
Mostrando falta de respeito pelo trabalho da cantora Brandi Carlile, Bonifácio distraiu-se e falou do concerto: "Brandi Carlile devia ter mais um ou dois pares de milhares de almas a assistir. Desde o Sudoeste de 2007, esta é a quarta vez que Carlile vem a Portugal, tudo graças a um trecho épico de uma canção num anúncio de cerveja. Carlile podia ter optado por tocar apenas esse trecho, mas preferiu fazer desfilar um sem-número de variações anódinas de rock adulto, em que invariavelmente a sua voz ia aos agudos com a fé dos devotos, assim estragando qualquer possibilidade de um final de tarde tranquilo. Fez uma data de versões, todas elas óbvias: dos Radiohead foi buscar "Creep"; de Cash "Folsom Prison Blues"; e de Cohen "Hallelujah". Carlile não gosta de música, gosta da hora de ponta da rádio FM".
Ah, espera. O fim do comentário tinha de ser jocoso e ofensivo - quer para Carlile quer para quem a ouve e, no caso, compra o PÚBLICO e fica a saber que não gosta de música, pela pena de um jornalista.
Segue-se outra banda. Mando Diao: "Mais uns milhares de almas depois, os Mando Diao subiram ao palco com guitarras barulhentas, um percussionista que também tocava trompete e duas coristas. Ganham pontos extra por tentarem fazer barulho, por terem um trompete e por terem coristas. Perdem esses pontos por não terem canções".
Pronto, os Mando Diao não têm canções. O que eu ouvi foi apenas barulho. Obrigado pela informação. Dizer que músicas os Mando Dia tocaram, partindo do princípio de que quem lê a notícia e compra o jornal tem interesse em saber o que aconteceu, isso o senhor Bonifácio não fez. Houve barulho. Nomes de canções tocadas é que não.
E agora a revelação do ano: músico que não anda nesta vida por causa da droga é caso raro. Pelo menos a julgar pelas palavras do sr. Bonifácio: "E assim se chegou a Duffy, que tem óptimas canções, mas poucas. Envergando um belo vestido com pintas pretas, ofereceu três quartos de hora de soul à antiga, a que só faltou uma secção de metais. A mais-valia desta moça de extraordinária voz é a sua crença pura: percebe-se que ela não está ali pelo cool ou pela droga. Ela gosta daquilo e enche as canções com uma alma rara. Fez muitas famílias e casalinhos felizes e merece a mesma felicidade ou mais ainda."
Curiosamente, o jornalista não referiu o facto de a maior parte dos espectadores estarem à hora deste concerto nas filas de hora e meia para comerem. Tão pouco noticiou (talvez não tenha reparado, ou até presenciado, já que podia/devia estar a jantar na tenda de imprensa/vip) que Duffy saiu de palco sem sequer se despedir do público.
O cabeça de cartaz, que colocou 30 mil aos saltos - algo que, já se viu antes, o sr. Bonifácio desaprova -, também teve direito a pérolas: "Às 23h30, os Killers subiram ao palco para espalhar o seu charme gongórico. Era basicamente por eles que a maior parte das pessoas ali estava, e fizeram sabê-lo reagindo entusiasticamente a cada movimentação de Brandon Flowers, o frontman"
Pelos vistos, as pessoas reagiram entusiasticamente a cada movimentação! Não quererá isso dizer... festa? (a tal que não houve no festival, segundo o título da notícia?)
"Por muito que não gostemos dos Killers (e não gostamos nem um pouco), ao menos têm um espectáculo tão bem ensaiado que, por um instante, quase acreditamos que estamos num festival de Verão, em que a juventude se entrega ao hedonismo e ao exagero próprios da saúde que tem. (Apesar de isso não ter acontecido.)"
Ou seja: o jornalista não gosta nem um pouco de Killers, mas reconhece que eles têm um espectáculo bem ensaiado. Depois, nesta frase desdiz a anterior. Se as pessoas reagiram entusiasticamente a cada movimentação, como raio é possivel dizer que não se entregaram ao hedonismo e ao exagero...?
Depois, uma análise à carreira dos Killers e não ao concerto. Menção a músicas tocadas? Mais uma vez... quase nada: "Todas as canções têm riffs óbvios que desaguam em refrões invariavelmente em crescendo, a base rítmica é sempre funk-deslavado ou disco-sound reciclado, todo o motivo melódico tem de ter um carácter épico e há sempre um sintetizador piroso para convencer os nostálgicos dos anos 80".
Mas... espera... afinal diz uma música. Para dizer mal, claro, e ainda para criar uma imagem agressiva e incómoda para o leitor - já para não referir o mau gosto: "A meio de 'All this things that I've done' (toalhas de órgãos berrantes, canto épico), ocorre-nos que eles estão a meio caminho entre os Def Leppard e o pior de Bruce Springsteen e quase ficamos à espera do momento em que vamos ouvir cantar uma versão fatela de 'Born in the USA' sob um fundo disco-sound enquanto a câmara foca um baterista com um só braço".
Depois de se rir com a imagem criada - e de, possivelmente, a ter divulgado rapidamente a todos os seus amigos, para que estes lhe tecessem loas -, a estocada final. Julgava, porventura, o sr. provedor que o sr. Bonifácio se tinha deixado de piadas de mau gosto ao CF os Belenenses? Pois então fique com esta, para analisar:
"Foi a festa possível e foi escassa como os fins de tarde futebolísticos no Restelo costumam ser".
Além do mau gosto, um fim de semana futebolístico não pode ser escasso. Pode ter escassa qualidade de jogo, pode até ter poucos jogos. Se queria insultar, é pena ter falhado o português. Mais: é pena que não saiba português, apesar de procurar palavras rebuscadas.
(fim de carta)
Das novas cartas publicadas no blogue do provedor, destaco uma ideia que fica no ar: deve o jornal enviar sempre aos concertos jornalistas que gostem das bandas (citação livre)? Claro que não! Mas tem de enviar jornalistas IMPARCIAIS, que sejam capazes de escrever colocando o preconceito (e gostos pessoais) de lado.
Se eu tivesse uma revista de gastronomia, não mandaria um jornalista vegetariano fazer a crítica a um restaurante de rodízio de churrasco! Parece-me óbvio de mais. A menos que, e esta é uma ressalva importante, ele me garantisse que iria provar os pratos servidos (algo improvável, sendo vegetariano) e avaliá-los de acordo com os mesmos padrões que outro qualquer colega o fizesse.
PS: Para crítica de música/reportagem de concertos recomendo a leitura dos textos normalmente publicados na revista Blitz, principalmente os da jornalista Lia Pereira (declaração de interesses: conheço-a pessoalmente, mas se não apreciasse a sua isenção e profissionalismo, simplesmente este dado seria omitido aqui).
Como leitor do PÚBLICO, impressiona-me que seja possível que uma reportagem possa ser totalmente preenchida com opinião do autor. Ao escrever sobre o festival, João Bonifácio não informou sobre o número de pessoas presentes, sobre os problemas que os "festivaleiros" tiveram, como por exemplo falta de casas de banho e filas de hora e meia para comer.
Pretendeu, apenas, usar as páginas do jornal onde escreve para dar uma opinião pessoal sobre o que viu e sobre o que não viu.
Que João Bonifácio não goste das bandas que tocaram no estádio do Restelo, que não goste do clube que joga no estádio do Restelo, nada contra. Que o transmita no texto que publica no jornal PÚBLICO já me surpreende mais. Não tanto por ser o senhor Bonifácio, sim por ser o PÚBLICO.
Refere-se aos adeptos do Belenenses como meia dúzia de "velhinhos" e ao ambiente do estádio como calmaria tal que "nem uma palha bule, é um sossego".
Conclui a ideia com esta barbaridade: "Portanto a ideia de fazer um festival de música popular naquele mesmo estádio quase parece uma acção de beneficência."
Deixando os velhinhos atrasadinhos mentais do Belenenses para trás, vamos então ofender os leitores. Afinal, pelo que leio no PÚBLICO, o comportamento de quem gosta de música rock num concerto é primário e culpa dos tempos de mudança, pelo menos na cabeça do sr. Bonifácio.
"Estavam entre mil a duas mil pessoas a vê-los, que gritavam quando as guitarras se levantavam. Mas bastava olhar para aquela juventude para notar ao que vinham: tinham t-shirts dos Killers, o nome The Killers desenhado nos braços, cartazes com a inscrição The Killers. Gritavam quando as guitarras explodiam porque foi isso que a música dos The Killers lhes ensinou: quando o volume explode, há que berrar".
Ou seja, os Killers ensinaram os burrinhos que ouvem rock há anos, que devem saltar e berrar (fazer, portanto, o festival que o senhor Bonifácio entende que não existiu - contraditório). Lamentável!
Mostrando falta de respeito pelo trabalho da cantora Brandi Carlile, Bonifácio distraiu-se e falou do concerto: "Brandi Carlile devia ter mais um ou dois pares de milhares de almas a assistir. Desde o Sudoeste de 2007, esta é a quarta vez que Carlile vem a Portugal, tudo graças a um trecho épico de uma canção num anúncio de cerveja. Carlile podia ter optado por tocar apenas esse trecho, mas preferiu fazer desfilar um sem-número de variações anódinas de rock adulto, em que invariavelmente a sua voz ia aos agudos com a fé dos devotos, assim estragando qualquer possibilidade de um final de tarde tranquilo. Fez uma data de versões, todas elas óbvias: dos Radiohead foi buscar "Creep"; de Cash "Folsom Prison Blues"; e de Cohen "Hallelujah". Carlile não gosta de música, gosta da hora de ponta da rádio FM".
Ah, espera. O fim do comentário tinha de ser jocoso e ofensivo - quer para Carlile quer para quem a ouve e, no caso, compra o PÚBLICO e fica a saber que não gosta de música, pela pena de um jornalista.
Segue-se outra banda. Mando Diao: "Mais uns milhares de almas depois, os Mando Diao subiram ao palco com guitarras barulhentas, um percussionista que também tocava trompete e duas coristas. Ganham pontos extra por tentarem fazer barulho, por terem um trompete e por terem coristas. Perdem esses pontos por não terem canções".
Pronto, os Mando Diao não têm canções. O que eu ouvi foi apenas barulho. Obrigado pela informação. Dizer que músicas os Mando Dia tocaram, partindo do princípio de que quem lê a notícia e compra o jornal tem interesse em saber o que aconteceu, isso o senhor Bonifácio não fez. Houve barulho. Nomes de canções tocadas é que não.
E agora a revelação do ano: músico que não anda nesta vida por causa da droga é caso raro. Pelo menos a julgar pelas palavras do sr. Bonifácio: "E assim se chegou a Duffy, que tem óptimas canções, mas poucas. Envergando um belo vestido com pintas pretas, ofereceu três quartos de hora de soul à antiga, a que só faltou uma secção de metais. A mais-valia desta moça de extraordinária voz é a sua crença pura: percebe-se que ela não está ali pelo cool ou pela droga. Ela gosta daquilo e enche as canções com uma alma rara. Fez muitas famílias e casalinhos felizes e merece a mesma felicidade ou mais ainda."
Curiosamente, o jornalista não referiu o facto de a maior parte dos espectadores estarem à hora deste concerto nas filas de hora e meia para comerem. Tão pouco noticiou (talvez não tenha reparado, ou até presenciado, já que podia/devia estar a jantar na tenda de imprensa/vip) que Duffy saiu de palco sem sequer se despedir do público.
O cabeça de cartaz, que colocou 30 mil aos saltos - algo que, já se viu antes, o sr. Bonifácio desaprova -, também teve direito a pérolas: "Às 23h30, os Killers subiram ao palco para espalhar o seu charme gongórico. Era basicamente por eles que a maior parte das pessoas ali estava, e fizeram sabê-lo reagindo entusiasticamente a cada movimentação de Brandon Flowers, o frontman"
Pelos vistos, as pessoas reagiram entusiasticamente a cada movimentação! Não quererá isso dizer... festa? (a tal que não houve no festival, segundo o título da notícia?)
"Por muito que não gostemos dos Killers (e não gostamos nem um pouco), ao menos têm um espectáculo tão bem ensaiado que, por um instante, quase acreditamos que estamos num festival de Verão, em que a juventude se entrega ao hedonismo e ao exagero próprios da saúde que tem. (Apesar de isso não ter acontecido.)"
Ou seja: o jornalista não gosta nem um pouco de Killers, mas reconhece que eles têm um espectáculo bem ensaiado. Depois, nesta frase desdiz a anterior. Se as pessoas reagiram entusiasticamente a cada movimentação, como raio é possivel dizer que não se entregaram ao hedonismo e ao exagero...?
Depois, uma análise à carreira dos Killers e não ao concerto. Menção a músicas tocadas? Mais uma vez... quase nada: "Todas as canções têm riffs óbvios que desaguam em refrões invariavelmente em crescendo, a base rítmica é sempre funk-deslavado ou disco-sound reciclado, todo o motivo melódico tem de ter um carácter épico e há sempre um sintetizador piroso para convencer os nostálgicos dos anos 80".
Mas... espera... afinal diz uma música. Para dizer mal, claro, e ainda para criar uma imagem agressiva e incómoda para o leitor - já para não referir o mau gosto: "A meio de 'All this things that I've done' (toalhas de órgãos berrantes, canto épico), ocorre-nos que eles estão a meio caminho entre os Def Leppard e o pior de Bruce Springsteen e quase ficamos à espera do momento em que vamos ouvir cantar uma versão fatela de 'Born in the USA' sob um fundo disco-sound enquanto a câmara foca um baterista com um só braço".
Depois de se rir com a imagem criada - e de, possivelmente, a ter divulgado rapidamente a todos os seus amigos, para que estes lhe tecessem loas -, a estocada final. Julgava, porventura, o sr. provedor que o sr. Bonifácio se tinha deixado de piadas de mau gosto ao CF os Belenenses? Pois então fique com esta, para analisar:
"Foi a festa possível e foi escassa como os fins de tarde futebolísticos no Restelo costumam ser".
Além do mau gosto, um fim de semana futebolístico não pode ser escasso. Pode ter escassa qualidade de jogo, pode até ter poucos jogos. Se queria insultar, é pena ter falhado o português. Mais: é pena que não saiba português, apesar de procurar palavras rebuscadas.
(fim de carta)
Das novas cartas publicadas no blogue do provedor, destaco uma ideia que fica no ar: deve o jornal enviar sempre aos concertos jornalistas que gostem das bandas (citação livre)? Claro que não! Mas tem de enviar jornalistas IMPARCIAIS, que sejam capazes de escrever colocando o preconceito (e gostos pessoais) de lado.
Se eu tivesse uma revista de gastronomia, não mandaria um jornalista vegetariano fazer a crítica a um restaurante de rodízio de churrasco! Parece-me óbvio de mais. A menos que, e esta é uma ressalva importante, ele me garantisse que iria provar os pratos servidos (algo improvável, sendo vegetariano) e avaliá-los de acordo com os mesmos padrões que outro qualquer colega o fizesse.
PS: Para crítica de música/reportagem de concertos recomendo a leitura dos textos normalmente publicados na revista Blitz, principalmente os da jornalista Lia Pereira (declaração de interesses: conheço-a pessoalmente, mas se não apreciasse a sua isenção e profissionalismo, simplesmente este dado seria omitido aqui).
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