O meu amiguinho Rui (ou uma história que vale a pena recordar, mesmo sendo lamechas e cómica ao mesmo tempo)

Eu e o Rui caminhávamos pela rua dele. Era de noite. Os nossos pais estavam numa reunião de "formadores" do Centro de Preparação para o Matrimónio. O dele era chefão da polícia e por qualquer estranha razão achou normal que dois putos de 12/13 anos saíssem de casa pelas 22.00 para irem dar uma volta. Isto numa rua no mínimo complicada.
Na altura estavam na moda os casacos de ganga com pelo por dentro. Eu tinha um.
E pelos vistos havia mais gente que queria tê-lo.Diria mesmo, muito mais gente.
A meio do nosso passeio pela fantástica rua com carros estacionados em todo o lado, um grupo de cerca de 10 jovens dirige-se a nós com a tradicional pergunta. "Têm um cigarro?". Hmmmm, 13 anos... hmmm, não seríamos os primeiros, mas estávamos mais perto de sermos os últimos. Respondemos a verdade.
"Esse casaco é giro", diz um deles, ao mesmo tempo que um círculo se fecha sobre nós. Nisto, facas começam a surgir, pistolas a brilhar. Hmmmm...
"Deixa-me experimentar o casaco", diz o mesmo, líder do gangue.
Tomando por princípio que não era boa ideia negar tamanho capricho, lá aceitei a sugestão. Tirei o casaco e... toma lá, vá.
A coisa até foi rápida. Eles desataram a correr - vá-se lá entender porquê - e tudo parecia ter acabado menos mal. Até que o meu amigo se lembra de desatar a correr atrás deles. Por artes mágicas - not - o rapaz que levava o casaco corria menos, pelo que acabámos por recuperar o precioso bem que ele largou na ânsia de não ser agarrado - sim que eu nunca iria atrás deles, mas quando vi o meu amigo correr fui também.
Ora, de repente o cenário muda. Temos nós o casaco e desatamos a correr, só que desta vez com uma nuance: tínhamos 10 ou 12 tipos com pistolas e facas a correrem atrás de nós! Vimos uma loja aberta e entrámos. Lá dentro, apenas uma senhora. Aparentemente mais assustada do que nós, mas suficiente para manter os rapazes à porta. "Ora, liga-se à polícia sugeri". "Pois, a loja não tem telefone", desabafa ela.
Então, como resolver o impasse? Se saíssemos haveria pancadaria da grossa (em nós, claro), se ficássemos eles acabariam por entrar na loja e, quem sabe, roubar também a própria senhora.
Nisto chega um gigante, saído de um qualquer filme de acção, e pergunta o que se passa. Blá, blá, blá e blá.
"Vá, vão-se embora que eles não vos fazem nada", sugere.
Nós, a medo, ainda perguntámos qualquer coisa e saímos. Nada nos aconteceu a não ser levar uma tareia de insultos. Que éramos filhos disto e daquilo. E blá blá blá blá.
Ainda hoje me lembro do Rui, orgulhoso.

(nunca mais o vi, porque na realidade a nossa amizade era amizade de filhos de amigos e nunca combinávamos nada, mas sei que o Rui teve uma vida difícil. O irmão gémeo dele morreu e ele nunca se perdoou por isso. Dizia que deveria ter sido ele a partir, porque ele é que era quase surdo e ele é que via muito mal, enquanto o irmão era a "perfeição física"!
Não serve de muito. Mas se um dia leres isto, amiguinho Rui, quero que saibas que tenho orgulho de ter assistido a tamanha prova de coragem.)

Comentários

Suz disse…
Só 10? Não devia ser na Damaia de certeza!

:P

Mensagens populares deste blogue

Uma ida ao endireita

Laser Tag Alfragide - Login ou Logout. 5 notas fundamentais